Trecho de um conto escrito em 1997, chamado (na época) Lésbicas falando de suas mães.
Talvez já tenha mostrado algum trecho. Meio infantil, mas simpático por causa disso. O título vem de uma frase da Camille Paglia, ou outra intelectual feminista... preciso verificar.
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"Saí do apartamento da Luciana umas nove e vinte, fui andando pra casa. Era um caminho gostoso, tava fresco, à noite. Acho que eu estava com uma sandália de couro trançado. Prendia no tornozelo, era meio bege, bonita. Tudo meio bege: era uma época que eu pintava o cabelo de loiro escuro, gostava de sair na rua toda assim, cor de madeira clara. Vestia umas roupas estranhas e pensava “sou alemã”.
Quando cheguei no meu andar a luz atrás da porta estava acesa. Não tinha música. Quando abri, a Rafaela estava deitada no meu colchão.
Passei a mão no cabelo dela, entre a testa e a orelha. A gente estava começando a namorar, eu ficava meio tímida de beijar de língua assim de cara.
Depois de olhar pra ela um pouco, a gente se beijou. Rafaela tinha esse cabelo preto e liso, muito macio - e uma boca tão pequena comparada à do meu namorado anterior, eu ainda estranhava. Os beijos eram longuíssimos, eu tinha noção dos meus próprios músculos, meu lábio muito mais forte que o dela.
Depois de transar fui buscar um copo d’água na cozinha. Rafaela veio atrás e a gente se beijou apoiadas no batente. De novo bateu tão forte que até doeu.
Não tinha cama. O colchão ficava no canto esquerdo da parede, no mesmo lado da porta de saída. Tinha uma colcha bordô. Rafaela deitava de lado, o braço em L, a cabeça sobre a mão. Eu estava de bruços, encostada à parede, sentindo o concreto no meu braço esquerdo.
A gente deve ter se beijado umas duas horas, porque eram muito tarde quando olhei no relógio. Quando deitei de costas, ela pôs a perna sobre as minhas, subiu sobre mim, aquele negócio me fez morrer, esqueci que ela era pequena e que eu tinha que me controlar.
Tinha um encaixe certo da coxa dela na minha virilha, meu braço que era longo e alcançava as costas, cintura e bunda dela ao mesmo tempo, orgasmo difícil de mensurar, só tinha consciência quando as costas do pé estavam geladas.
- A Luciana disse que transar com mulher é que nem brincar de casinha.
- Ah, é?
- Ela disse.
- Sei.
- Li uma mulher falando no jornal... que as lésbicas ficam abraçadas a noite inteira, conversando sobre suas mães.
- Você quer falar sobre a minha mãe?
- Não necessariamente.
- Pois saiba que minha mãe é uma gostosa.
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